O presidencialismo é, sem dúvida, um sistema de governo muito popular, especialmente nessa parte do mundo. Ele está previsto nas constituições de todos os países da região, com exceção de Canadá e alguns países caribenhos¹. No entanto, isso não quer dizer que esses presidencialismos sejam todos iguais. Cada país americano adaptou-o à sua realidade social e política. No Brasil, não foi diferente. Com nosso longo histórico presidencialista, a discussão sobre esse sistema de governo foi reacendida com a redemocratização do país nos anos 1980 e o tema chegou, inclusive, a ser alvo de plebiscito durante a década de 1990.
Conceitos importantes
Para falarmos de presidencialismo, precisamos entender que toda a discussão em torno desse sistema de governo tem início no final do século XVIII, com a Revolução Americana. O seu surgimento está atrelado às concepções de democracia e soberania popular. Com a independência dos Estados Unidos, os envolvidos no processo revolucionário passaram a ver com maus olhos as monarquias absolutistas europeias e seus déspotas incontroláveis.
O contexto abriu caminho para a influência de ideias como as de Montesquieu, que defendia o equilíbrio entre os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário e um sistema de freios e contrapesos.
Entre as características fundamentais do presidencialismo estão²:
- O Presidente como Chefe do Estado e Chefe do Governo – Isso significa que ao mesmo tempo que chefia o Poder Executivo, o Presidente da República desempenha funções de representação do país no exterior. Dessa maneira, ele possui a função governativa, sendo a ele atribuídas não apenas as tarefas executivas, mas também poder decisório sobre os mais variados temas.
- A unipessoalidade da chefia do Executivo – Embora possua um corpo de auxiliares diretos para ajudá-lo, provendo principalmente informações, a responsabilidade de determinar as diretrizes do Poder Executivo cabe exclusivamente ao Presidente da República. Esse corpo de assessores forma o que se convencionou chamar Gabinete da Presidência. Eles não precisam ser aprovados por nenhum outro poder e podem ser demitidos a qualquer tempo. A unipessoalidade da presidência também é atestada quando pensamos na função de vice-presidente. Este não tem qualquer atribuição. Cabe ao presidente determinar sobre o que ele poderá ou não se inteirar.
- A escolha do Presidente se dá pelo povo – Em outras palavras, as pessoas que administram o governo devem ser designadas pelos cidadãos do Estado. Tal escolha pode se dar de forma indireta, como no caso dos colégios eleitorais dos Estados Unidos, ou direta, como acontece na maior parte dos países presidencialistas. Nesse sentido, quanto mais pessoas participarem desse processo, mais nos aproximaremos de um ideal democrático.
- O mandato do Presidente da República deve ser exercido por prazo determinado – De maneira a salvaguardar o processo eleitoral e o exercício do voto, o Presidente é escolhido por prazo predeterminado. As eleições são um aspecto essencial no presidencialismo, pois são elas que garantem o seu caráter democrático. Esse aspecto tem sido especialmente debatido nas últimas décadas, por conta da adoção de reeleição em diferentes países, especialmente latino-americanos. Há uma divisão clara entre os países que não possuem reeleição, como Chile e Uruguai, e os que a aprovaram, entre eles, Argentina e Brasil. De qualquer forma, há o entendimento majoritário de que nos casos em que exista a reeleição, esta não deve se dar ilimitadamente, devendo restringir-se a apenas uma recondução.
- O poder de veto do Presidente da República – Cabe ao Congresso, isto é, ao Poder Legislativo, a atribuição de legislar. No entanto, dentro da lógica de controle entre os poderes, esse poder de criar leis não pode (nem deve) ser absoluto. Dessa forma, para evitar uma “ditadura do Legislativo” e uma função meramente executora do Poder Executivo, convencionou-se atribuir ao Presidente da República o poder de veto. Isso significa que, via de regra, os projetos aprovados pela Câmara e pelo Senado devem ser encaminhados para a sanção presidencial. Esta nada mais é que a manifestação de concordância do Presidente em relação à lei aprovada pelo Legislativo. Se a opção do Presidente for pelo veto, a matéria deve ser reencaminhada ao Legislativo para apreciação. A casa legisladora pode derrubar o veto mediante votação especial.
O presidencialismo no Brasil
O Brasil adotou o presidencialismo no momento da Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889. Muito se especulou desde então sobre as razões da opção presidencialista em detrimento do parlamentarismo no país, mas o fato é que a influência do movimento republicano e de sua visão pró-Estados Unidos contribuiu para explicar a escolha brasileira.
Não faltam análises históricas que reforcem a ideia de que a sociedade brasileira sempre se apegou a figuras conhecidas como “homens fortes” e de caráter centralizador. Nesse sentido, a figura do Presidente da República combinaria mais com essa perspectiva. Arnaldo Godoy fala mesmo na existência de um presidencialismo imperial no Brasil, que teria como característica o hiperdimensionamento da imagem do presidente³. Dentro dessa visão, seria o presidente da República o grande responsável pelos sucessos e infortúnios do povo brasileiro.
O presidencialismo se tornou tão forte na estrutura política brasileira que se consolidou historicamente como a grande opção constitucional, tendo sido adotado em períodos ditatoriais e democráticos no país.
Se, por um lado, segundo Dalmo Dallari, o presidencialismo concede maior estabilidade, unidade e rapidez à tomada de decisão, por outro, o grau de centralização do processo decisório pode ser usado para desvirtuações. O impeachment previsto na legislação, como instrumento penal, só pode ser usado, segundo o autor, nos casos em que o Presidente da República tenha cometido um crime. No entanto, como reforça Dallari, “é perfeitamente possível que o presidente, adotando uma política inadequada, mas sem praticar qualquer ato delituoso, cause graves prejuízos ao Estado, não havendo, nessa hipótese, como retirá-lo da presidência e impedir a manutenção da política errônea”.
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