O dia 28 de junho, Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, intersexo, assexuais e outras identidades), marca a luta pelos direitos desse grupo ao redor do mundo.
A data tem sua origem no que hoje é considerado o “marco zero” do movimento LGBT: a revolta de Stonewall Inn, que ocorreu no mesmo dia, em 1969. Em Stonewall, um dos bares gays mais conhecidos de Nova York à época, manifestantes da comunidade resistiram a uma invasão policial e marcharam pelo direito de reconhecimento de suas identidades e de sua liberdade durante 6 dias. Esse foi o ato de resistência mais marcante do movimento até hoje, que levou o ativismo LGBT ao debate público e às ruas, além de ter motivado a emergência de várias organizações civis e motivado a 1ª parada do orgulho LGBT, no ano seguinte.
A importância do episódio se deu não só nos Estados Unidos, mas também no palco mundial, e, desde então, a comunidade tem conquistado cada vez mais reconhecimento de seus direitos fundamentais. Um grande marco a ser citado é a resolução da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 17 de maio de 1990, que retirou a homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças e Transtornos Mentais.
Embora tenha havido muitos avanços desde então, a população LGBTQIA+ ainda sofre com a violência e com a discriminação. Segundo o Observatório de Mortes e Violências Contra LGBTI+, a violência contra gays, travestis e mulheres trans entre 20 e 39 anos aumentou 33% no Brasil em 2021: foram 316 vítimas. E a violência física é apenas uma faceta da questão.
No caso do Brasil, há, inegavelmente, uma fragilidade legislativa e jurídica na proteção desse grupo, bem como uma dificuldade em concretizar certos direitos devido à falta de representação política. Dessa forma, o objetivo desse texto é discutir o atual cenário do Brasil com relação à visibilidade LGBTQIA+ e os possíveis avanços que podem ser feitos nessa área.
A priori, é interessante mencionar que a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 1°, inciso III, determina que todos os cidadãos brasileiros tenham direito à vida, à saúde, ao trabalho, à liberdade, à igualdade e à justiça. O artigo 5°, por sua vez, garante a igualdade e proíbe a discriminação com base na identidade de gênero. Não há nenhuma garantia constitucional explícita de direitos para a comunidade LGBTQIA+, mas estes princípios se aplicam para todos os cidadãos do país. Garantir os direitos da população LGBTQIA+, portanto, é dever constitucional.
Diante disso, o movimento LGBT teve importantes conquistas políticas ao longo das últimas décadas. Embora suas reivindicações tenham ganhado força no país a partir de 1990, o início da década de 2000 marcou os primeiros avanços concretos com a criação de algumas políticas públicas por parte do governo. Entre elas estão o Brasil sem Homofobia, programa de combate à violência criado em 2004; o Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, de 2009; e o Sistema Nacional de Promoção de Direitos e enfrentamento à violência contra LGBT, de 2013.
Além disso, foram criadas leis municipais e estaduais que versam sobre o tema, como a Lei n° 2.615 do Distrito Federal, que estabelece penalidades administrativas a qualquer pessoa física ou jurídica, bem como a qualquer órgão e entidade da administração pública, que promover ou permitir a discriminação por motivos de orientação sexual. Decisões judiciárias também são instrumentos fulcrais para a garantia dos direitos LGBTQIA+. Foi um julgamento do STF em 2019 que equiparou os crimes que tiveram como motivação a LGBTfobia aos crimes raciais, aplicando penas simétricas às da Lei do Racismo (Lei 7716/89). O próprio reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo foi resultado de uma decisão do STF, o que trouxe maior segurança jurídica à população LGBTQIA+.
Contudo, é notória a atuação tímida do Congresso Nacional no que diz respeito ao tema. Embora tenha tramitado no Congresso um projeto de lei que visava criminalizar a LGBTfobia, o PL perdeu força e foi colocado de lado pelos parlamentares. É raro que projetos visando regulamentar outras pautas do movimento LGBT avancem. Algumas das reivindicações atuais são: o aumento de opções de gênero no registro civil, o uso de banheiros e demais espaços segregados conforme a identidade de gênero, entre outras.
Uma possível explicação para essa inércia é a falta de representação desse grupo entre os parlamentares eleitos.
Apesar de ter crescido no pleito de 2018, o número de parlamentares LGBTQIA+ no Congresso ainda não é representativo da proporção de pessoas integrantes da comunidade: dos 513 deputados e 81 senadores eleitos em 2018, somente 3 assumiram publicamente serem LGBTQIA+, segundo o Congresso em Foco. Juntos, são um total de 0,5% dos representantes no Poder Legislativo. Embora outros parlamentares se coloquem como aliados e defensores das pautas LGBTQIA+, é necessário ressaltar o papel fundamental da representatividade na elaboração de leis e políticas públicas de impacto.
A ocupação dos espaços de poder se mostra fundamental para o ativismo LGBT nos dias de hoje, considerando a força crescente da pauta conservadora na política. Nos últimos anos, houve alguns retrocessos na garantia dos direitos conquistados até agora – um exemplo claro é a ausência de qualquer diretriz programática voltada a esse grupo no orçamento anual mais recente elaborado pelo governo. Também pode-se citar a resistência de grupos à direita do espectro político à chamada “ideologia de gênero”, bem como ao uso da linguagem neutra.
Portanto, observa-se a importância de celebrar a organização da sociedade civil como forma de resistência e de combate à marginalização, mas, no Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+, também é preciso relembrar a importância do voto como meio de exercer a cidadania e promover uma maior representatividade deste grupo nos Poderes Legislativo e Executivo.
Sabrina Santos Peres
Graduanda em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB), estagiária do Senado Federal e redatora voluntária da Politize!
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