A PEC 23/21, mais conhecida como PEC dos precatórios, tem ocupado um grande espaço nos periódicos do Brasil. A controvérsia em cima dela é alta. Dessa forma, acompanhá-la torna-se vital para entender como as despesas públicas serão administradas nos próximos anos.
De início, é vital explicar o que são precatórios. A palavra, comum apenas no juridiquês e economiquês, tem origem latina, e tem como significado “rogar, pedir, solicitar”. A regulamentação dos precatórios na Constituição vigente pode ser encontrada no art. 100 da Carga Magna. O termo refere-se ao pagamento de dívidas judiciais da fazenda pública, o Estado, em suas múltiplas esferas, estados, municípios, distrito federal e união, além disso, autarquias, empresas e fundações; o pagamento é expedido pelo Judiciário após a sentença receber decisão sem possibilidade de recurso, em juridiquês: trânsito em julgado. As requisições recebidas até 1 de julho entram na proposta orçamentária do próximo ano, as que são recebidas após o prazo entram na folha de pagamento do ano subsequente.
Os débitos de natureza alimentícia, débitos decorrentes de salário, vencimentos, proventos, pensões e seus complementares, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou invalidez também poderão ser pagos por meio de precatórios, caso atendam os critérios estabelecidos na Constituição.
A despesa pública com os precatórios têm aumentado ano a ano, principalmente com benefícios previdenciários, dobrando em comparação de 2016 a 2021. Os valores pagos representaram 0,49% do PIB em 2016, já em 2021 somam 0,71%. O aumento de despesas com o INSS, entretanto, estabilizou-se em 2021. A hipótese para explicar tal controle sugere que o esforço de implementação tempestiva dos benefícios surtiu efeito, assim como o fato de que poucas foram as decisões favoráveis aos segurados por conta da pandemia de 2020.
Apesar dessa redução, segundo cálculos do governo, haverá um aumento insustentável com pagamento de precatórios, saindo de R$ 54,4 bilhões para R$ 89,1 bilhões para o próximo ano. O valor do pagamento assusta a equipe econômica. Se o cálculo estiver correto, o ministro da economia, Paulo Guedes, ameaça que será necessário comprometer os demais gastos do Executivo tendo em vista que não é possível pagar os precatórios e continuar com o mesmo orçamento para outras políticas públicas essenciais. Isso porque ainda está vigente a Emenda Constitucional (EC) 95, conhecida como a emenda do teto de gastos, aprovada durante o governo de Michel Temer.
Com o objetivo de contornar o problema, o executivo propôs a PEC 23/21, que altera a forma de pagamento até 2029 dos precatórios com valor acima de 60 mil salários mínimos, 66 milhões atualmente, as dívidas poderão ser pagas com entradas de 15% e nove parcelas anuais. De acordo com o ministro da economia, caso a PEC seja aprovada será possível parcelar 47 precatórios, “gerando” uma economia de 22,7 bilhões de reais.
Além da alteração do regime de pagamento, a proposta prevê ainda que o contribuinte com o direito de receber os precatórios poderá utilizá-lo para pagar dívida com a União. Também consta a criação de um fundo público a ser abastecido por valores oriundos da venda de imóveis públicos, dividendos repassados por estatais e das concessões de partilha de petróleo. O objetivo do fundo é contribuir para o pagamento de precatórios.
Em audiência pública, Eduardo Gouvêa, presidente da Comissão Especial de Precatórios da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, declarou que a PEC não resolve a situação e configura calote em credores e “pedalada fiscal”. O texto, segundo a ordem, prejudica o pagamento de dívidas cujos recursos seriam destinados à educação. Na mesma audiência, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação – CNTE também expressou uma avaliação contrária à PEC. Os representantes dos estados e municípios pediram alteração do texto.
O deputado Hugo Motta (Republicanos/PB) apresentou hoje (07/10), na comissão especial, a sua relatoria da proposta. De acordo com o parlamentar, é inegável a necessidade do equacionamento dos precatórios a fim de não prejudicar o avanço de políticas públicas. Entretanto, o parecer de Motta cria um teto de gastos de R$ 40 bilhões a partir de 2022. Apesar da leitura, a comissão não votou o parecer do deputado, os parlamentares pediram vista coletiva por mais duas sessões para que possam melhor analisar a criação do texto proposto por Motta. A previsão atual é que a matéria seja deliberada na terça-feira, 19/10.
Além de condenar a proposta, a OAB considerou o texto inconstitucional e alegou que o dispositivo fere duas cláusulas pétreas: separações dos poderes e direitos e garantias individuais. Entretanto, em comissão especial própria, a ordem apresentou soluções para de fato resolver o problema do pagamento dos precatórios. Publicaremos na semana que vem o debate concentrado nas soluções propostas pela Ordem e outros especialistas.
Isaias Candido
Bacharel e Licenciado em Letras, e Graduando em Ciência Política pela Universidade de Brasília.
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