Ao início deste mês, um pacote de Propostas de Emenda à Constituição tem chamado a atenção e recebido inúmeros apelidos: PEC das Bondades, Kamikaze, Desespero, Fura Teto de Gastos e também a PEC do Risco Eleitoral. Essa proposta tem gerado inúmeras polêmicas, principalmente pelo fato de ter recebido um único voto contrário no Senado Federal, do senador José Serra (PSDB/SP) durante o processo de votação. O objetivo deste artigo é fazer uma análise sobre o contexto da PEC das Bondades e como uma votação conseguiu chegar a quase unanimidade no Senado.
Aspectos específicos do Governo Bolsonaro
Por alguns fatores, o governo Bolsonaro bateu o recorde e possui as 5 PECs mais rápidas desde 1988: A PEC dos Precatórios (Duas aprovadas), Orçamento alternativo, adiamento das eleições e da exclusão do teto de gastos da partilha do petróleo. Se essa PEC for aprovada até quarta-feira (13/07), também ocupará o Ranking na nona posição.
A emergência social e de saúde pública tende a ser um dos fatores para aceleração no processo de aprovação de Propostas de Emendas à Constituição, mas a existência de outras formas de conseguir aliados é um fator relevante, tratando das emendas de relator. Os dados abaixo são do PODER 360 produzidos pela Metapolítica.
Em outra análise, o Governo Bolsonaro também foi o que aprovou mais Propostas de Emenda à Constituição desde a redemocratização, contabilizando 23 PECs até então.
Falando especificamente da PEC Kamikaze (pretendo falar de todos seus apelidos e deixar o leitor escolher o que parece mais apropriado), os Senadores tiveram que fazer uma análise diferente das outras, com um quesito ainda mais especial: seu teor e a proximidade das eleições. Para entender melhor isso, aqui está uma breve descrição do pacote:
PEC DA BONDADE (PECs 1 e 16/2022)
Ementas:
1. Altera a Emenda Constitucional nº 109, de 15 de março de 2021, para dispor sobre a concessão temporária de auxílio diesel a caminhoneiros autônomos, de subsídio para aquisição de gás liquefeito de petróleo pelas famílias de baixa renda brasileiras e de repasse de recursos da União com vistas a garantir a mobilidade urbana dos idosos, mediante a utilização dos serviços de transporte público coletivo, e autorizar a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios a reduzirem os tributos sobre os preços de diesel, biodiesel, gás e energia elétrica, bem como outros tributos de caráter extrafiscal.
16. “Altera a Constituição Federal para estabelecer que a União prestará auxílio financeiro aos Estados e ao Distrito Federal, com o objetivo de compensar perdas de arrecadação decorrentes da redução das alíquotas relativas ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, incidente sobre o óleo diesel combustível e o gás liquefeito de petróleo, derivado de petróleo e de gás natural”.
Na deliberação final a PEC 1/2022 foi prejudicada pela aprovação da PEC 16/2022, apensada, que passou a versar também sobre parte do conteúdo da primeira. Assim, ementa do substitutivo aprovado ficou da seguinte maneira:
“Inclui o art. 120 no Ato das disposições Constitucionais Transitórias para reconhece o estado de emergência decorrente da elevação extraordinária e imprevisível dos preços do petróleo, combustíveis e seus derivados e dos impactos sociais deles decorrentes; autoriza a União a entregar auxílio financeiro aos Estados e ao Distrito Federal que outorgarem créditos tributários do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) aos produtores e distribuidores de etanol hidratado; expande o programa auxílio Gás dos Brasileiros, de que trata a Lei nº 14.237, de 19 de novembro de 2021; institui auxílio para caminhoneiros autônomos; expande o programa Auxílio Brasil, de que trata a Lei nº 14.284, de 29 de dezembro de 2021, e institui auxílio para entes da Federação financiarem a gratuidade do transporte público”.
O primeiro e grande destaque a ser feito está no trecho grifado, no qual o Congresso Nacional passaria a reconhecer o estado de emergência decorrente da elevação imprevisível dos preços do petróleo. Esse trecho está apresentado para que os gastos feitos possam estourar o Teto de Gastos imposto desde o Governo Temer e driblar a legislação eleitoral, que proíbe a criação de benefícios destinados a pessoas físicas em ano de eleições, exceto quando há emergência.
Na perspectiva parlamentar, sob a questão dos Congressistas votarem de forma favorável, cabe refletir a justificativa da oposição se juntar ao governo, apesar de ser um fator crucial que pode mudar as intenções de votos nas eleições deste ano. Mesmo sendo críticos à proposta, vale lembrar que aquele que votar contra poderá sofrer um grande impacto na popularidade em um contexto eleitoral. Cabe então aos políticos compreenderem em que medida isso pode ser vantajoso já que há uma tendência natural no formato atual, do congresso formar maioria meramente com as bancadas governistas e do Centrão, principalmente se tratando de medidas de benefício direto da população.
Sobre o mérito, essa medida tende a beneficiar uma grande parcela da população a curto prazo, e o auxílio para as famílias em situação de pobreza sempre foi uma bandeira da esquerda, sendo assim, mais uma pressão para votar favoravelmente. No entanto, também cabe avaliar os impactos econômicos que podem ser uma armadilha econômica para 2023, como é apresentado a seguir:
“Somando os R$42 bilhões dessa PEC com o impacto de R$100 bilhões do projeto que alterou o ICMS (imposto sobre circulação de mercadorias e serviços), temos uma ação de cerca de R$150 bilhões. E essa conta tende a crescer ainda mais. Talvez sejamos o país que esteja gastando mais no mundo para enfrentar a crise dos combustíveis, mas falta qualidade do gasto”, diz Leo Cézar, economista, consultor do Senado e um dos idealizadores do Instituto Fiscal Independente (IFI)”.
“Um dos pontos mais complicados é que ela prevê um aumento de gastos para além de 2022. Ela prevê zerar a fila do Auxílio-Brasil e coloca o valor do benefício em R$600. É um cenário muito difícil para qualquer governante mudar. Imagine o custo político de, em janeiro de 2023, você dizer ao eleitor mais pobre que ele vai perder esse benefício”, diz Gabriel Barros”.
Conclusão
Essa PEC repleta de bondades para os eleitores pode ser um grande respiro para quem não lidera as pesquisas e possui a máquina do estado a seu favor, no entanto, terá que lidar com outras problemáticas no curto, médio e longo prazo. Sendo assim, cabe ao leitor compreender as possíveis consequências de um 2023 incerto, economicamente falando.
Graduando em Ciência Política na Universidade de Brasília (UnB) e Presidente da Strategos Consultoria Política Jr.
Os textos publicados no Blog não representam as ideias ou opiniões da Metapolítica e são de responsabilidade exclusiva de seus autores.