Recentemente, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Nunes Marques tomou uma decisão monocrática que contrariou muitos de seus pares. O ministro devolveu o mandato a deputados que perderam os seus cargos após decisões colegiadas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), corte a qual possui como integrantes alguns ministros do STF (Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Ricardo Lewandowski).
Trata-se da suspensão dos mandatos de Fernando Francischini (União/PR), Emerson Bacil (União/PR), Paulo do Carmo (União/PR) e Cassiano Caron (União/PR), todos deputados estaduais pelo Paraná, e Valdevan de Jesus (PL/SE), deputado federal pelo Sergipe. Todos estes são parlamentares ligados ao presidente Jair Bolsonaro (PL) e tiveram os cargos restituídos depois que o ministro Nunes Marques decidiu, via liminar, pela devolução dos mandatos dos referidos deputados.
Vale lembrar que o ministro Nunes Marques foi indicado, por Bolsonaro, para a vaga do ex-ministro Celso de Mello, que se aposentou da Suprema Corte em outubro de 2020.
Tanto ministros do STF como ministros do TSE olharam a decisão de Marques com estranheza, visto que ela contraria julgamentos realizados no plenário do próprio TSE. Alguns recursos contra a decisão do ministro foram impetrados no STF e ficarão sob a relatoria da ministra Cármen Lúcia, que remeterá a discussão ao plenário do Supremo.
Sem fazer referência ao mérito das decisões, é importante notar o embate interno entre as instituições do Estado. O Judiciário acaba entrando em conflito interno, no momento em que um único ministro do STF contraria decisões colegiadas, mesmo que de outro tribunal (TSE), mas que conta com a participação de ministros do próprio Supremo em sua composição atual.
Outra crise institucional é entre o Legislativo e o Judiciário, pois estes poderes, de certa forma, entraram em conflito quando deputados foram suspensos por decisões judiciais. Este conflito é natural, de acordo com o Ordenamento Jurídico Brasileiro, entretanto, a longo prazo pode desgastar a relação entre os Poderes.
No tocante às eleições de outubro deste ano, os conflitos citados acima podem conturbar ainda mais o ambiente. É notório que Bolsonaro e seus aliados já vinham travando disputas com a Justiça Eleitoral, no que se refere ao processo eleitoral, em especial, à credibilidade das urnas eletrônicas. Neste sentido, os desdobramentos desses conflitos podem ter reflexo durante as eleições e abre a possibilidade de o debate sobre o tema ser pautado pela opinião pública até outubro.
Em resumo, o conflito entre parte do Judiciário com alas bolsonaristas criam um potencial cenário de disputa entre instituições e que tem o potencial de ditar a condução de campanhas eleitorais para o próximo pleito. O que pode beneficiar os governistas, caso a população adira ao discurso bolsonarista, mas também pode causar o efeito contrário, se por ventura a credibilidade do Judiciário e do sistema eleitoral permaneça consolidada.
Historiador e cientista político pela Universidade de Brasília (UnB).