Definida como a base para o estabelecimento de um Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, a Lei Complementar nº 173/2020¹, sancionada no dia 27 de maio de 2020, veio, sobretudo, para dar alívio financeiro para Estados e Municípios durante esse duro período de crise que se enfrenta por conta da pandemia do novo coronavírus.
Em sentido amplo, as ações de enfrentamento do referido programa podem ser condensadas em pelo menos 5 tópicos; são eles:
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Suspensão dos pagamentos das dívidas contratadas pelos Estados e Municípios junto à União;
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Reestruturação de operações de crédito interno e externo junto ao sistema financeiro e instituições multilaterais de crédito;
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Suspensão de atos que provoquem aumento da despesa com pessoal;
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Suspensão do pagamento dos refinanciamentos de dívidas de municípios com a Previdência Social com vencimento entre 1º de março e 31 de dezembro de 2020;
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Repasse de recursos, na forma de auxílio financeiro no valor total de 60 bilhões de reais, aos Estados, Distrito Federal e aos municípios, subdivididos em 4 parcelas mensais de igual valor.
Sem dúvida, tais ações de enfrentamento surgem em boa hora e se tornam ferramenta fundamental para o alívio das contas públicas dos Estados e dos Municípios.
O último tópico aqui destacado em relação a esse programa, mais especificamente, corresponde a uma medida cujo impacto pode ser mensurado de maneira bastante clara e direta, haja vista o volume dos valores envolvidos e a sua forma de distribuição imediata. Mais especificamente, a União irá destinar 10 bilhões de reais para ações de saúde e assistência social (sendo 7 bilhões para os Estados e 3 bilhões para os Municípios), além de 50 bilhões de reais para mitigação da crise financeira (sendo 30 bilhões para os Estados e 20 bilhões para os municípios).
Desde 2015, vale lembrar, esses entes vêm passando pelas mais diversas dificuldades em perspectiva econômica. Definitivamente, os desequilíbrios orçamentários se tornaram ponto focal dos gestores públicos nos últimos anos. Os municípios, sobretudo, cuja realidade de arrecadação apresenta realidades absolutamente distintas em todo o território nacional (sendo até mais desiguais quando se realiza um comparativo entre Estados) terão, finalmente, um aporte direto de recursos federais.
A questão que fica, entretanto, é do ponto de vista mais objetivo desse cenário: o “Programa Federativo de Enfrentamento do Coronavírus” será realmente suficiente?
A Confederação Nacional de municípios (CNM) realizou um breve levantamento² sobre o assunto neste mês de junho. Nesse levantamento, algumas respostas a esta pergunta parecem ganhar corpo. A se destacar inicialmente, a CNM afirma que “os R$ 60 bilhões a Estados e Municípios recompõem apenas parte das perdas na arrecadação de tributos durante a pandemia” (CNM, 2020, p. 9). Em valores, a CNM (2020) destaca o seguinte:
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O ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) já caiu 24% em abril e poderá ter uma queda de R$ 22,2 bilhões até o final do ano;
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O FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) deve ter uma redução próxima a 30%, o que representa R$ 16,3 bilhões a menos;
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O FPM (Fundo de Participação dos Municípios) terá recomposição para o mesmo patamar de 2019 nos meses de março a junho. Contudo, entre julho e dezembro, a estimativa de perda gira em torno de R$ 5,89 bilhões;
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O ISS (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza) deve cair R$ 20 bilhões;
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O IPTU (Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana) e o ITBI (Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis) sofrerão queda de, em média, 25%, o que configura perda superior a R$ 10,1 bilhões.
Apenas por esses indicadores abarcados pelo levantamento da CNM, a estimativa de impacto negativo da arrecadação dos municípios pode ser estimada em pelo menos 70 bilhões de reais. Os 23 bilhões destinados aos municípios pela Lei Complementar nº 173/2020 recomporia apenas algo em torno de 30% dessas perdas.
Apesar de essencial e significar um alívio a curto prazo, o repasse ainda não é suficiente. Os municípios continuarão sua peleja habitual de falta de recursos, dessa vez, com o peso de uma crise econômica a se aprofundar e uma pandemia que custa em não acabar.
REFERÊNCIAS:
¹ Lei Complementar nº 173, de 27 de maio de 2020.
² Confederação Nacional de Municípios. “Boletim CNM – Junho de 2020”. Brasília, pp. 16, 2020.
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Arthur Ives N. da M. Lima
Integrante da Metapolítica, bacharel e mestre em Sociologia pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), atualmente é doutorando em Sociologia Política por essa mesma instituição. Atua no monitoramento e na formulação de estratégias de atuação junto ao Poder Legislativo.