Nos últimos dias, em decorrência das comemorações do 7 de setembro onde se comemora a independência do Brasil, foram convocadas manifestações pelo Presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido). Estes atos nas capitais e cidades estratégicas, geraram reivindicações antidemocráticas, falsas falas sobre a Constituição Federal e ataques diretos ao Supremo Tribunal Federal, principalmente ao Ministro Alexandre de Moraes.
De fato, reivindicar mudanças nos Poderes, nas Políticas Públicas e demais instituições pertencentes à estrutura pública administrativa do país é legalmente permitido pelo Art. 5. § 16, da Constituição Federal, que versa sobre o livre direito do povo se reunir pacificamente e sem armas, em local aberto ao público.
O presidente versou palavras em tom de ameaça também ao Presidente do STF, atualmente Luiz Fux. “Ou o chefe desse Poder enquadra os seus ou esse Poder pode sofrer aquilo que não queremos. Porque nós valorizamos e reconhecemos o poder de cada República. Nós todos aqui na Praça dos Três Poderes juramos respeitar a nossa Constituição. Quem age fora dela se enquadra ou pede pra sair.”. Dessa forma, em ataque direto e antidemocrático do maior representante legal do nosso país, manifestantes caíram no ‘conto do vigário’ e inflados com o apoio do Presidente, de forma abrupta, um grupo chegou a provocar um foco de incêndio na entrada do prédio do Ministério de Relações Exteriores (Itamaraty) e tumultuaram a entrada do Ministério da Saúde num período de 2 dias desde o início das manifestações.
O ponto alto foram os bloqueios de rodovias em pelo menos 15 estados do país, gerando um engavetamento e atrasos de entregas importantes das mais variadas com cargas além de faixas defendendo “intervenção militar”, prisão dos 11 ministros do STF e “liberdade de expressão”.
A obra mais tocante de toda a manifestação foi o grito de caminhoneiros, manifestantes e apoiadores em geral sobre a instauração do Estado de Sítio. Vídeos geraram um tom cômico, como se bolsonaristas vivessem em uma outra realidade, visto que a notícia era falsa.
*vídeo retirado das redes sociais
A realidade por trás de um desejo utópico deveria ser embasada pela Constituição Federal, pela qual os grupos de apoiadores do Presidente, pedem pela reformulação. A utopia da instauração do Estado de Sítio se dá por questões que envolvem mais que o sim ou não do Presidente da República.
O que diz a Constituição sobre o Estado de Sítio
Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio.
Vejamos, de acordo com a Constituição Federal, o Estado de Sítio é um instrumento burocrático e político, que traz à tona uma suspensão dos Poderes – Legislativo e Judiciário (em um período limitado, ou seja, temporário de no máximo 30 dias, podendo ser prorrogado em tempos de guerra), dando ao Presidente da República o poder máximo, no intuito somente de facilitar e acelerar ações governamentais em tempos de crise, aumentando a eficiência do funcionamento do Estado.
A instauração do Estado de Sítio não dá ao Chefe de Estado total liberdade para tomar quaisquer decisões que bem entender, não o beneficiando politicamente ou somente em questões pessoais.
Como foi explicitado no Artigo 139 da Constituição Federal, há ações dadas pelo Estado de Sítio que podem cercear os direitos individuais em algumas questões, como a suspensão da liberdade de reunião, restrições a direitos como inviolabilidade da correspondência, obrigação de permanência em um certo local, direito de busca e apreensão, pelo Estado, em domicílios e intervenção dos serviços públicos em empresas particulares além da requisição de bens individuais pelo Estado. São somente alguns exemplos, não necessariamente todos vão ocorrer, muito menos ao mesmo tempo.
Após o decreto de Estado de Sítio chegar ao fim, todas as ações tomadas ou deixadas de lado durante o momento extraordinário, deverão ser relatadas e apresentadas pelo Presidente da República para o Congresso Nacional, exibindo também todas as justificativas para tais atos apresentados em relatório, além de nomes de pessoas físicas, jurídicas ou entidades prejudicadas durante o Estado de Sítio, para efeito de garantir que crimes de abuso de poder não sejam efetuados e aqueles que cometerem, tenham a oportunidade de serem investigados e julgados.
Outro ponto onde os grupos bolsonaristas deixaram passar de lado, foi que durante o Estado de Sítio, há a possibilidade da Mesa do Congresso Nacional formar uma comissão composta por cinco cidadãos brasileiros (juntamente com os líderes partidários nas Casas Legislativas), com o propósito de auxiliar na fiscalização e apuração das ações tomadas.
Finalizando, todo esse desejo utópico se esvai por água abaixo como foi mostrado. Há uma Constituição Federal que deve ser seguida e nela há as diretrizes específicas para tal ato. Não houve e possivelmente não haverá Estado de Sítio no atual Governo. Mas para fins históricos e demonstrativos, em nosso país, no Brasil, estivemos em Estado de Sítio em 1932 (antes da promulgação da Constituição de 88 e validação da mesma), declarado pelo Presidente da República Arthur Bernardes (1922-1926). Na época, a decisão foi tomada pela ameaça no Rio Grande do Sul e Guerra Civil separatista.
Quem pode instaurar o Estado de Sítio
Hoje, para se tornar realidade, o Estado de Sítio só poderá ser solicitado por quem ocupa o cargo do Executivo – Presidente da República, seguindo todos os passos da Constituição e em consonância com os Conselhos deliberativos e Congresso Nacional.
O Brasil não está em Estado de Sítio, foi apenas uma fake news ou uma outra realidade utópica num desejo ardente dos fiéis apoiadores do Presidente Jair Bolsonaro de poder tomar medidas políticas à livre arbítrio.
João Paulo Domingueti Barreto
Graduando em Gestão de Políticas Públicas pela Universidade de Brasília – UnB.
*Qualquer opinião emitida neste artigo não reflete necessariamente a opinião da Metapolítica Consultoria e Assessoria Parlamentar.